10 de set. de 2012

Monza 1972, dois relatos e a mesma paixão.

Bando sem noção hoje se completam 40 anos da primeira conquista brasileira do mundial de formula um. O primeiro título do grande Emerson Fittipaldi. Data esta que fez com que o Emerson descrevesse via twitter o que aconteceu durante aquele fim de semana. Relato esse que me fez lembrar os meus tempos de criança e o inicio por essa paixão que se chama automobilismo. Vamos ao relato do Emerson, tomei a liberdade de transcrevê-lo para este blog  para aqueles que não têm twitter pudessem saber o que aconteceu há 40 anos. 

“Hoje sexta feira há 40 anos, muita tensão muita pressão, a decisão do campeonato mundial estava muito perto. O caminhão da Lotus capotou na estrada no caminho de Monza perto de Milão, perdi o meu carro principal. Trouxeram meu carro de teste da Inglaterra. Tiveram que trabalhar a noite toda para preparar meu carro de quinta para sexta, a pressão aumentava. Sexta eu estava muito tenso e o carro não estava bom! Toda a equipe Lotus muito nervosa, O Collin Chapman genial melhorou o carro para sábado. A Pressão aumentava, mas sábado o carro melhorou. Estava bom, mas não ótimo, daria para domingo de manhã melhorar para o warm up. Depois da classificação, voltando para o hotel, eu questionava: será que daqui 24horas serei o campeão mundial de F1? Faltavam 20 horas para largar o GP. Comi no restaurante do hotel um spaguetti pomodoro, carbo para domingo à tarde. 

Será a ultima reunião com o Collin Chapman, o Eddie Dennys chefe dos mecânicos e o talentoso chefe de equipe Peter Warrs. Para o grande prêmio tínhamos que melhorar a Lotus 72, na mudança de direção nas gincanas, saia de frente. Colocamos um pouco de asa dianteira antes de dormir, perguntava e afirmava: o acerto tem que estar melhor para o warm up de tanque cheio. Queria um carro um pouco de frente com o tanque cheio, neutro no meio da corrida e um pouco de traseira no fim, assim estaria perfeito. Meu grande desafio seria o mestre bicampeão Jackie Stewart, será que ele estava como eu ansioso? Tudo isso passava pela minha cabeça. Outro grande desafio seria a combinação J.Ickx/Ferrari, sempre andam muito rápido em Monza. Fui dormir umas 10 e antes de dormir fiz uma oração. Pedi a Deus que me desse calma e um sono tranquilo para conseguir dormir as 8 horas que precisava para descansar. Meus reflexos e sensibilidade estavam na superfície, estavam no máximo da percepção que um ser humano podia chegar. Fui dormir pronto para esse maior desafio da minha vida. GP da Itália em Monza, decisão do título mundial, só faltavam 17 horas, Monza me espera. 

Acordei 6:30 a.m, senti borboleta no estomago! Estava só a 7 horas da largada do GP. Dormi muito bem, mas a expectativa e a ansiedade queriam tomar conta de mim. Meu lado latino/brasileiro com a origem italiana do lado do meu pai Fittipaldi estava emocionado demais, o meu lado polonês/russo da minha mãe, Vojciechovski mais frio e analítico era o que precisava tanto naquele momento. Assim consegui equilibrar as minhas emoções. Não comi muito no café da manhã, pois nessa época sempre havia risco de ter 1acidente e se precisasse de cirurgia não poderia estar com o estomago cheio. Em Monza 1970 perdi um grande amigo e campeão Jochen Rindt. Antes de ir para a pista tinha que apagar essa memória de 1970, pois poderia me atrapalhar. Resolvi sair do hotel determinado a usar as 3 armas fortes que eu tinha: meu sangue italiano, meu sangue russo e o meu sangue brasileiro. Meu sangue brasileiro, o mais forte, pois nasci no Brasil e aprendi sempre a improvisar e me adaptar a qualquer situação. Sai do hotel com a faca na boca. Estava determinado não só a tentar ganhar o campeonato, mais queria também vencer o GP da Itália.

 Cheguei ao box da Lotus com muita fé em Deus. Cumprimentei o Colin Chapman, o Peter Warr com muito otimismo e entusiasmo, senti alguns mecânicos me cumprimentarem com um sorriso amarelo, muita tensão. Sai para o warm up. Tinha que amaciar discos/pastilhas de freio novos. Dei 3, 4 voltas e comecei a acelerar. Colin e equipe melhoraram o carro para a corrida. O Carro saia um pouco de frente de tanque cheio, mais melhorou muito a mudança de direção na gincana. Estava muito confiante. Tudo perfeito, carro rápido. Voltando para o box, senti um frio nas minhas costas. Grande problema, o tanque de gasolina estava vazando, pânico! Não daria tempo para consertar antes do GP. Fui para o motorhome e o chefe dos mecânicos Eddie Dennys disse: “vou tentar trocar e por um tanque novo. Vamos fazer de tudo para você estar no grid.” Entrei no motorhome, me desliguei de tudo, só pensava comigo mesmo. Não vou perder o equilíbrio, o carro vai estar pronto. Continuei com o máximo de adrenalina, todos os sensores do meu corpo a 110% pronto. Fisicamente, mentalmente e espiritualmente estava pronto!!  

Faltavam alguns minutos antes de fechar a saída do Box quando o Eddie me chamou e disse: “O seu carro está pronto”. Sentei rápido no meu carro Lotus 72. Tudo sobre medida para o meu corpo, estava perfeito, mais eu sabia que aquele dia todos aqueles que me ajudaram desde que comecei a fabricar volante, Kart com Mário Napa e todas as outras pessoas que me ajudaram ate aquele dia, estariam junto comigo no cockpit, milhões de brasileiros assistindo. Muita responsabilidade e pressão! Mas toda essa torcida não só de brasileiros, mas fãs meus naquele momento tão critico me davam força e confiança.

Alinhei no grid a partir dali não queria falar com ninguém, só me concentrar na minha missão de vencer neste dia. Sabia que as 3 primeiras voltas,saindo de 6 no grid tinha que tomar muito cuidado para não arriscar meu título e o GP da Itália nas primeiras curvas. Quando completei a primeira volta a equipe me sinalizou Stewart out (fora), pensei que bom, mas não me conformei em só terminar a corrida para garantir o campeonato, queria vencer o GP da Itália. Sabia que da metade do GP para frente iria estar muito rápido, o carro estava ajustado para as ultimas 20 voltas. E foi o que aconteceu, estava chegando no líder. Icxs com a Ferrari. Ia ser difícil passar, mas eu estava pronto para esse novo desafio. Já estava bem perto da Ferrari e ele teve uma falha mecânica e entrou no Box. 

A partir dai tinha que administrar a vitória. As últimas 10 voltas desse GP foram as 10 voltas mais longas da minha vida!  No meu subconsciente vieram muitas perguntas durante essas 10 voltas, o motor esta roncando bem? O cambio engata as marchas da maneira correta? O Carro não esta vibrando? O freio está bom? A adrenalina no limite do limite, quando faltavam 3voltas uma mistura de emoções era muita emoção para um só ser humano. Eu pedia para o meu sangue russo controlar o meu sangue brasileiro que estava querendo explodir. Emerson fique frio menos de 3 voltas. Entrei para a ultima volta, o título e a vitoria estavam bem perto, levava o carro com toda delicadeza e leveza para não ter nenhum problema de cambio, freio ou motor! Entrando na parabólica, ultima curva faltavam alguns metros e pensei se quebrar o motor ou cambio consigo com o embalo atravessar a linha de chegada em neutro. Vejo o Collin Chapman pulando na pista, jogando o boné para o alto, comemorando não só mais uma vitoria da Lotus, mais meu campeonato mundial.

 Eu não tinha radio, mas estava gritando e chorando no carro com muitaaaa emoção. Quando voltei foi um fim de semana que começou. Muito difícil, muito dramático, mas que no fim foi premiado com o título mundial, quando voltei ao box o publico italiano começou a invadir a pista. Parei a Lotus na frente do Box, a minha família, meus pais, meu irmão, Maria helena, era muita emoção, todos gritando e chorando. E nesse momento queria agradecer a Deus por essa oportunidade, todos que me ajudaram na minha carreira, a todos meus fãs do Brasil e do mundo que sempre me apoiaram. Ate o meu grande amigo Braguinha e Lu estavam lá... Que comemoração, que dia inesquecível e agora se passaram 40 anos desse dia mais a paixão e amor por corrida de automóvel continua igual."

 Depois deste relato, de me emocionar e chorar, lembrei-me do velório do meu pai em 2008, três semanas após o Gp brasil. Onde no meio da noite, minha tia me perguntou: "Ávilas, você ainda gosta de formula um?"  Eu prontamente respondi: "Não só gosto, como vou todo ano a Interlagos." e minha tia retrucou: " Incrível, quando você era pequeno, você ficava no colo do seu pai sentado no sofá vendo as corridas sem piscar os olhos e quando o Emerson ganhava, você pulava do colo dele e ficava na frente da televisão gritando: Emerson, Emerson, Emerson."

Em 1972 eu tinha apenas cinco anos de idade e não me recordo deste fim de semana onde o Emerson ganhou o campeonato, mas tenho certeza que foi um desses dias em que saltei do colo do meu pai e na frente da velha TV telefunken preto e branco que tínhamos, para poder gritar sem parar: Emerson, Emerson, Emerson.

Hoje aos 45 anos de vida enquanto escrevo essas linhas com os olhos cheios de lágrimas saudosas, só tenho que agradecer o meu velho pai que me apresentou as corridas de carro e ao Emerson que começou a sedimentar o meu amor por elas. Por isso, como ele termina seu relato "se passaram 40 anos mais a paixão e amor por corrida de automóvel continua igual.", em todos os fins de semana que tem corrida, me sento à beira da TV,  Living time e Twitter ligados no PC e minha filha de quatro anos sentada no meu colo. Porque a sabedoria se passa de pai para filho e a paixão e o amor por corridas para a filha também, mesmo a contragosto da mãe. 


POR:

Ávilas Rocha 




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